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Vestibular de Inverno 2005Provas e Gabaritos

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10/07/2005
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(prova realizada em 09/07/2005)
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LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA (discursiva) - todos os cursos
Prova realizada no dia 10/07/2005


Texto:

São Paulo 10 de Novembro, 1924

Meu caro Carlos Drummond

1 (...) Eu sempre gostei muito de viver, de maneira que nenhuma manifestação da vida me é indiferente. Eu
tanto aprecio uma boa caminhada a pé até o alto da Lapa como uma tocata de Bach e ponho tanto
entusiasmo e carinho no escrever um dístico que vai figurar nas paredes dum bailarico e morrer no lixo
depois como um romance a que darei a impassível eternidade da impressão. Eu acho, Drummond, pensando
5 bem, que o que falta pra certos moços de tendência modernista brasileiros é isso: gostarem de verdade da
vida. Como não atinaram com o verdadeiro jeito de gostar da vida, cansam-se, ficam tristes ou então fingem
alegria o que ainda é mais idiota do que ser sinceramente triste. Eu não posso compreender um homem de
gabinete e vocês todos, do Rio, de Minas, do Norte me parecem um pouco de gabinete demais. Meu Deus!
se eu estivesse nessas terras admiráveis em que vocês vivem, com que gosto, com que religião eu
10 caminharia sempre pelo mesmo caminho (não há mesmo caminho pros amantes da Terra) em longas
caminhadas! Que diabo! estudar é bom e eu também estudo. Mas depois do estudo do livro e do gozo do
livro, ou antes vem o estudo e gozo da ação corporal. (...) E então parar e puxar conversa com gente
chamada baixa e ignorante! Como é gostoso! Fique sabendo duma coisa, se não sabe ainda: é com essa
gente que se aprende a sentir e não com a inteligência e a erudição livresca. Eles é que conservam o espírito
15 religioso da vida e fazem tudo sublimemente num ritual esclarecido de religião. Eu conto no meu "Carnaval
carioca" um fato a que assisti em plena Avenida Rio Branco. Uns negros dançando o samba. Mas havia uma
negra moça que dançava melhor que os outros. Os jeitos eram os mesmos, mesma habilidade, mesma
sensualidade mas ela era melhor. Só porque os outros faziam aquilo um pouco decorado, maquinizado,
olhando o povo em volta deles, um automóvel que passava. Ela, não. Dançava com religião. Não olhava pra
20 lado nenhum. Vivia a dança. E era sublime. Este é um caso em que tenho pensado muitas vezes. Aquela
negra me ensinou o que milhões, milhões é exagero, muitos livros não me ensinaram. Ela me ensinou a
felicidade.
 
ANDRADE, Mário de. A lição do amigo: cartas de Mário de Andrade a Carlos Drummond de Andrade.
Rio de Janeiro: J. Olympio, 1982, pp. 3-5.

"Inúmeros são os casos de troca de correspondência entre artistas, escritores, músicos, cineastas, teatrólogos e
homens comuns em nossa tradição literária. Mário de Andrade, por exemplo, foi talvez o maior de nossos
missivistas. Escreveu e recebeu cartas de Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Tarsila do Amaral,
Câmara Cascudo, Pedro Nava, Fernando Sabino, só para citar alguns. O conjunto de sua correspondência não só
nos ajuda a conhecer o seu pensamento, seus valores e sua própria vida, como também entender boa parte da
história e da cultura brasileira do século XX."
DINIZ, Júlio. "Cartas: narrativas do eu e do mundo" In Leituras compartilhadas - cartas. Fascículo especial 2, ano 4.
Rio de Janeiro: Leia Brasil / Petrobras, 2004, p.10.

A partir da leitura do trecho da carta de Mário a Drummond e do comentário acima, responda aos seguintes itens:

Questão 01 (valor: 2,0 pontos)

a) Percebe-se na carta uma crítica direta a uma certa postura elitista em relação à arte e à vida de grande parte da intelectualidade brasileira da época. Retire do texto duas passagens que comprovam tal afirmação.

b) Comente, com suas próprias palavras, a visão que Mário de Andrade possui das manifestações estéticas oriundas do povo.
   
Respostas:
a) "o que falta pra certos moços de tendência modernista brasileiros é isso: gostarem de verdade da vida"; "Eu não posso compreender um homem de gabinete e vocês todos, do Rio, de Minas, do Norte me parecem um pouco de gabinete demais" ; "estudar é bom e eu também estudo. Mas depois do estudo do livro e do gozo do livro, ou antes vem o estudo e gozo da ação corporal" ; "Fique sabendo duma coisa, se não sabe ainda: é com essa gente que se aprende a sentir e não com a inteligência e a erudição livresca" , "Aquela negra me ensinou o que milhões, milhões é exagero, muitos livros não me ensinaram. Ela me ensinou a felicidade".

b) A defesa e a incorporação de elementos e valores da cultura popular à cultura erudita caracterizam a visão de Mário de Andrade expressa na carta.

Questões: 01 | 02 | 03 | 04 | 05 | demais provas




Questão 02 (valor: 2,0 pontos)

Mário de Andrade, ao comentar um trecho de seu poema "Carnaval Carioca", demonstra encanto por uma moça que, segundo ele, "dançava com religião". Explique, com suas palavras, o que seria, na visão do autor, "dançar com religião".

   
Respostas:

a) Segundo o autor, "dançar com religião" é dançar de forma espontânea, intensa e prazerosa.

Questões: 01 | 02 | 03 | 04 | 05 | demais provas


Questão 03 (valor: 2,0 pontos)

Retirado do contexto, o trecho "(não há mesmo caminho pros amantes da Terra)" pode ser interpretado de duas maneiras distintas, considerando-se diferentes acepções atribuídas à palavra mesmo.

a) Quais são as interpretações possíveis?

b) Qual é interpretação mais adequada à carta de Mário de Andrade? Justifique a sua resposta.
   
Respostas:

a) Uma interpretação possível é "não há, de jeito nenhum, caminho para os amantes da Terra". Outra interpretação é de que "não há caminho idêntico para os amantes da Terra".

b) A interpretação mais adequada é "não há caminho idêntico para os amantes da Terra" pois, de acordo com o texto, como as terras do Rio, de Minas e do Norte são admiráveis, longas caminhadas por esses caminhos seriam sempre interessantes. Já a interpretação de que "não há, de jeito nenhum, caminho para os amantes da Terra" torna o texto sem sentido.

Questões: 01 | 02 | 03 | 04 | 05 | demais provas


Questão 04 (valor: 2,0 pontos)

a) Segundo o autor, do fato de certas pessoas não terem gosto verdadeiro pela vida decorrem algumas conseqüências. Quais são elas?

b) Observando a concordância nominal empregada em cada um dos enunciados abaixo, aponte as diferenças de significado existentes entre eles.

A - moços de tendência modernista brasileiros
B - moços de tendência modernista brasileira

   
Respostas:
a) Cansaço, tristeza e, o que seria ainda pior, alegria fingida.

b) No enunciado A, trata-se de moços brasileiros com tendência modernista; no enunciado B, trata-se de moços cuja tendência modernista é brasileira.


Questões: 01 | 02 | 03 | 04 | 05 | demais provas


 

Questão 05 (valor: 2,0 pontos)

a) Na carta a Drummond, Mário de Andrade utiliza uma linguagem mais coloquial, trazendo a impressão, algumas vezes, de que a interação está ocorrendo na modalidade oral da língua. Transcreva do texto dois exemplos dessa manifestação da oralidade na escrita.

b) No texto, a subjetividade é marcada pelo emprego de pronomes e verbos em 1ª pessoa. No entanto, em determinado trecho, entre as linhas 6 e 14, o autor faz uso repetidamente de um outro recurso de linguagem para expressar sua emoção. Que recurso é esse?

c) Considere o período "Este é um caso em que tenho pensado muitas vezes." Reescreva-o substituindo o verbo pensar pelo verbo aludir. Faça as modificações que julgar necessárias.

Respostas:

a) "pensando bem" , "dum"; "duma", "(...)o que milhões, milhões é exagero, muitos(...)".

b) O recurso é o ponto de exclamação.

c) "Este é um caso a que tenho aludido muitas vezes."


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