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Vestibular 2001Provas e Gabaritos


 
04/12/2001
11/12/2001
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DISCURSIVAS
OBJETIVAS
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Questões:

1
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Português e Literatura Brasileira - Todos os Grupos
Prova discursiva realizada no dia 04/12/2001

Observação: Serão aceitas outras respostas, desde que atendam adequadamente aos requisitos de cada questão.

 

1

Valor: 2,0 pontos

Texto 1

O Prazer e a Dor

     Quanto a Sócrates, sentara-se no leito e, tendo encolhido a perna,esfregava-a fortemente com a mão. E enquanto a             
 
esfregava dizia-nos: "Como parece aparentemente desconcertante, amigos, isso que os homens chamam de prazer! Que
 
maravilhosa relação existe entre a sua natureza e o que se julga ser o seu contrário, a dor! Tanto um como a outra recusam  ser
 
simultâneos no homem; mas procure-se um deles - tenhamos preso um deles - e estaremos sujeitos quase sempre a encontrar
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também o outro, como se fossem uma só cabeça ligada a um  corpo duplo! Parece-me, mesmo, que Esopo, se nisso tivesse pensado,
 
teria composto uma fábula a esse respeito: a Divindade, desejosa de lhes pôr fim aos conflitos, como visse frustrado o seu intento, 
 
amarrou juntas as duas cabeças; e é por isso que, onde se apresenta um deles, o outro vem logo. É, assim, que se lhe afiguram
 
as coisas: devido ao grilhão, há pouco sentia dor na minha perna, e já agora sinto prazer! 
 
[...]                

(Platão. Fedon, Coleção Os pensadores. 5ª ed. São Paulo: Nova Cultural, p. 60-61)

Texto 2

A propósito de botas

 
     [...] Fui descalçar as botas, que estavam apertadas. Uma vez aliviado, respirei à larga, e deitei-me a fio comprido, enquanto
 
ospés, e todo eu atrás deles, entrávamos numa relativa bem-aventurança. Então considerei que as botas apertadas são uma das
 
maiores venturas da Terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de as descalçar. Mortifica os pés, desgraçado,
 
desmortifica-os depois, e aí tens a felicidade barata, ao sabor dos sapateiros e de Epicuro. [...] Inferi eu que a vida é o mais engenhoso
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dos  fenômenos, porque só aguça a fome, com o fim de deparar a ocasião de comer, e não inventou os calos, senão porque eles
 
aperfeiçoam a felicidade terrestre. Em verdade vos digo que toda a sabedoria humana não vale um par de botas curtas. 

(Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Obra Completa, vol. 1, p. 555-556)

 

A) Ao tematizar a relação entre prazer e dor, os textos 1 e 2 valem-se de imagens concretas semelhantes - a do grilhão e a das botas. Diga que idéia comum essas imagens ajudam a caracterizar.

B) Explique: Do texto 1, depreende-se que, pelo menos de um certo ponto de vista, a dor e o prazer se excluem.

C) Explique a ironia presente na seguinte passagem do texto 2 (linha 5-6): "e não inventou os calos, senão porque eles aperfeiçoam a felicidade terrestre"

Resposta

A) As imagens do grilhão e das botas ajudam a caracterizar a idéia de que há uma estreita relação entre o prazer e a dor. Sugere-se, nos dois textos, que o prazer é um estado associado à supressão da dor, isto é, um estado que se faz sentir pelo contraste com o seu oposto. As imagens das botas apertadas e do grilhão ilustram bem essa idéia, pois, nos dois casos, o prazer resulta justamente da remoção daquilo que gerava a dor.

B) Do texto 1 depreende-se que a dor e o prazer, embora sejam sensações ou estados intimamente relacionados, excluem-se no que diz respeito à possibilidade de ocorrerem ao mesmo tempo no homem, o que fica óbvio na passagem "tanto um como o outro recusam ser simultâneos no homem".

C) A ironia presente na passagem em destaque resulta da associação entre o tema grandioso do aperfeiçoamento da felicidade terrestre e algo tão prosaico quanto a existência de calos. Tomada ao pé da letra, essa associação parece despropositada, o que favorece a leitura do trecho como irônico.

 

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2

Valor: 2,0 pontos

Texto 3

A ciência do medo e da dor

 
      [...]
 
      As razões pelas quais sentimos dor são muito parecidas com as que nos fazem sentir medo. Do ponto de vista evolutivo,
 
as atuais reações de medo talvez sejam um refinamento das reações mais primitivas de dor. Nesse aspecto, a capacidade de sentir
 
doré tão importante quanto a de sentir medo: motivar respostas de defesa diante de estímulos ameaçadores. Pessoas que de algum
 
modo  tornaram-se insensíveis à dor não reagem prontamente a estímulos desse tipo e por isso acidentam-se facilmente, sofrendo
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cortes, queimaduras ou até lesões ósseas. 
 
     As informações neurais de dor têm sua origem em  receptores ou terminações nervosas presentes na pele, em músculos
 
e em órgãos internos. Esses receptores transformam os  estímulos nociceptivos (táteis, mecânicos ou térmicos) em impulsos
 
nervosos e os transmitem para o cérebro. Os sinais associados a estímulos de dor são especialmente eficazes em provocar medo,
 
mas o estímulo doloroso, por si só, não causa qualquer reação de medo - isso ocorre graças à associação do estímulo da dor com
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outros estímulos ambientais.
 
     [...]

Nota: nociceptivo (adj.): capaz de transmissão de dor

(Cruz, A.P.M. e Landeira-Fernandez, J. de. Revista Ciência Hoje, vol. 29, n° 174, p. 21-22)

Texto 4

Confidência do Itabirano
Carlos Drummond de Andrade

 
Alguns anos vivi em Itabira.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,  
 
Principalmente nasci em Itabira. 
 
é doce herança itabirana.
 
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. 
 
 
 
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
 
De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
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Oitenta por cento de ferro nas almas.
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
 
E esse alheamento do que na vida é porosidade e
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esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil;
 
                                                         [comunicação.
 
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
 
 
 
este orgulho, esta cabeça baixa... 
 
A vontade de amar, que me paralisa o trabalho, 
 
 
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres
Tive ouro, tive gado, tive fazendas. 
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                                                            [e sem horizontes.
 
Hoje sou funcionário público
 
 
20
Itabira é apenas uma fotografia na parede. 
 
 
Mas como dói! 

(In Obra Completa. 6ª ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, p. 57)

A) É comum caracterizar-se a dor como um fenômeno negativo. Explique como o texto 3 aponta para a possibilidade de considerá-la, ao contrário, como um fenômeno positivo.

B) Com base na leitura dos textos 3 e 4, compare os "estímulos nociceptivos" (texto 3, linha 7) e a "fotografia na parede" (texto 4, linha 20) como elementos deflagradores de dor.

C) Uma das características da poética de Carlos Drummond de Andrade é a recorrência de figuras que simbolizam o ser desajeitado, o homem torto, a criatura deslocada e afastada dos homens comuns. Transcreva, no espaço próprio do Caderno de Respostas, um verso do poema que ilustre essa condição do poeta como ser deslocado diante das coisas do mundo. Justifique sua escolha.

Resposta
A) No texto 3, a dor é caracterizada de forma positiva, salientando-se a sua importância como mecanismo de autopreservação. Por motivar respostas de defesa diante de estímulos ameaçadores, a dor ajuda a prevenir incidentes potencialmente nocivos aos organismos; conforme destacado no texto, pessoas insensíveis à dor são mais propensas a sofrer acidentes.

B) O texto 3 caracteriza a dor de um ponto de vista científico e objetivo, priorizando sua dimensão mais fisiológica. No texto 4, por sua vez, a dor comparece associada a uma experiência particular, individual, não podendo ser reduzida ao plano do sofrimento meramente físico. Assim sendo, enquanto os estímulos nociceptivos podem ser vistos como deflagradores objetivos de dor física, o mesmo não se dá com relação à fotografia na parede, pois a dor por ela provocada não pode ser compreendida como processo objetivo, cientificamente previsível, desvinculado de vivências pessoais.

C) "E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação". O "eu lírico" sente-se alheio, distante do contato direto e da comunicação com os outros homens.

 

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3
Valor: 2,0 pontos

A) Nos seguintes períodos, há excesso de construções subordinadas, com uso enfadonho de "quês". Reescreva-os, eliminando todos os "quês" destacados. Faça as alterações necessárias, mas mantenha o sentido original. (Não é permitido substituir "que" por "o qual", "a qual" e respectivas flexões).

Estudos recentes indicam que o riso é um dos melhores remédios para os males da alma. Os cientistas descobriram que ele é um dos principais processos que deflagram a produção da serotonina, que é a substância que é responsável pela sensação de bem-estar. Gargalhadas e sorrisos francos fazem com que aumente a quantidade de serotonina que o organismo libera, podendo evitar que as pessoas entrem em estados depressivos.

B) Nas expressões abaixo, é sempre possível inverter a ordem entre o termo de valor substantivo e o termo de valor adjetivo? A inversão acarreta sempre uma mudança sensível no significado da expressão? Dê respostas completas e justificadas.

 
i) estímulo ambiental ii) relação maravilhosa iii) resposta certa

Resposta
A) Estudos recentes indicam ser o riso um dos melhores remédios para os males da alma. Os cientistas descobriram que ele é um dos principais processos deflagadores da produção da serotonina, substância responsável pela sensação de bem-estar. Gargalhadas e sorrisos francos provocam o aumento da quantidade de serotonina liberada pelo organismo, podendo evitar que as pessoas entrem em estados depressivos.

B) A inversão entre o termo de valor substantivo e o termo de valor adjetivo é perfeitamente possível nas expressões "relação maravilhosa" e "resposta certa", não sendo, entretanto, natural se aplicada à expressão "estímulo ambiental". Entre os dois casos de inversão possível e natural, apenas em (iii) há mudança sensível no significado: quando posposta ao substantivo, a palavra "certa" corresponde a "correta"; quando antesposta, equivale a "determinada".

 

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4

Valor: 2,0 pontos

A) Suponha que o texto abaixo vá ser divulgado em um site da Internet sobre o tratamento da dor e que você é o revisor encarregado de garantir a qualidade da redação. Reescreva-o, eliminando TRÊS problemas de redação apresentados.

A dor faz com que o paciente, já debilitado em conseqüência da enfermidade, vê-se incapacitado de realizar as mais simples atividades que está habituado, tais como cuidar da higiene pessoal, alimentar-se e levantar-se do leito. É necessário, então, cuidados muito especiais, para evitar piora na qualidade de vida do paciente.

B) Reescreva o texto abaixo, pontuando-o.

A moral epicurista

A moral epicurista é uma moral hedonista o fim supremo da vida é o prazer que é concebido como o único bem o único mal é a dor nenhum prazer deve ser recusado a não ser por causa de conseqüências dolorosas e nenhum sofrimento deve ser aceito a não ser em vista de um prazer no epicurismo não se trata portanto do prazer desejado pelo homem vulgar trata-se do prazer avaliado pela razão escolhido prudentemente.

(texto extraído e adaptado do site www.mundodosfilosofos.com.br/epicurismo.htm)

Resposta

A) A dor faz com que o paciente, já debilitado em conseqüência da enfermidade, veja-se incapacitado de realizar as mais simples atividades a que está habituado, tais como cuidar da higiene pessoal, alimentar-se, levantar-se do leito, etc. São necessários, então, cuidados muito especiais, para evitar piora na qualidade de vida do paciente.

B) A moral epicurista é uma moral hedonista. O fim supremo da vida é o prazer, que é concebido como o único bem; o único mal é a dor. Nenhum prazer deve ser recusado, a não ser por causa de conseqüências dolorosas, e nenhum sofrimento deve ser aceito, a não ser em vista de um prazer. No epicurismo não se trata, portanto, do prazer desejado pelo homem vulgar; trata-se do prazer avaliado pela razão, escolhido prudentemente.

 

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5

Valor: 2,0 pontos

Texto 5

     Beijei  na areia os sinais de teus passos, beijei os meus braços que tu havias apertado, beijei a mão que te ultrajara num
 
momento  de loucura, e os meus próprios lábios que roçaram tua face num beijo de perdão.
 
momento  de loucura, e os meus próprios lábios que roçaram tua face num beijo de perdão.
 
abençoei  este sofrimento!... Era alguma cousa de ti, um ímpeto de tua alma, a tua cólera e indignação, que tinham ficado em minha
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pessoa  e entravam em mim para tomar posse do que te pertencia. Pedi a Deus que tornasse indelével esse vestígio de tua ira, que
 
me santificara como uma cousa tua!
 
...........................................................................................................................................................................................................................
 
      Quero guardar-me toda só para ti. Vem, Augusto: eu te espero. A minha vida terminou; começo agora a viver em ti.

(José de Alencar. Diva. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996. p. 121)

A) O texto acima é um trecho do último capítulo de Diva, romance de Alencar que, ao lado de Senhora e Lucíola, forma a trilogia de "perfis femininos". Trata-se de uma carta escrita por Emília, protagonista da estória, ao jovem médico Augusto. A partir da leitura do texto, indique as características românticas presentes no fragmento, justificando com exemplos.

B) "Há poesia
Na dor
Na flor
No beija-flor
No elevador

(Oswald de Andrade. Poesias reunidas. São Paulo: Círculo do Livro, 1976, p. 184)

Existe um elemento, no fragmento do poema transcrito acima, que não mantém ligação alguma com o imaginário romântico que habita o texto de Alencar. Determine esse elemento e explique, com suas próprias palavras, a importância de sua presença como símbolo de um novo momento estético na literatura brasileira.

Resposta

A) Tom marcadamente subjetivo e emocional ("Beijei na areia os sinais de teus passos"); sentimentalismo exagerado ("Que suprema delícia, meu Deus, foi para mim a dor que me causavam os meus pulsos magoados pelas tuas mãos!"); exploração de uma temática ligada aos seguintes elementos: sofrimento, dor, ira, indignação, perdão e paixão ("Como abençoei este sofrimento!...Era alguma cousa de ti, um ímpeto de tua alma, a tua cólera e indignação...").

B) O elemento presente no poema de Oswald de Andrade que não mantém ligação alguma com o imaginário romântico é "elevador". O poeta, de acordo com os postulados defendidos pelo Modernismo de 22, sustenta a idéia de que a poesia está presente em todas as palavras, coisas e lugares, inclusive, "No elevador".

Observação: Serão aceitas outras respostas, desde que atendam adequadamente aos requisitos de cada questão.